Flávio Azevedo
Rodaram os quatro cantos as imagens do cantor Zeca Pagodinho ajudando as pessoas vitimadas pela enchente que atingiu Xerém nessa semana. Frases de todos os tipos, enaltecendo ou pondo dúvidas, a iniciativa do cantor, foram escritas em redes sociais e comentadas na grande mídia. Uma coisa, porém, poucos analisam: “por que o ser humano tem essa necessidade de endeusar as pessoas ou por que, sobretudo no Brasil, nós temos essa necessidade de cultuar um “Salvador da Pátria”?
Em todos os setores, a mídia sempre produz um salvador, um mito, um semideus, para causar a famosa sensibilidade (ou sensacionalismo). No futebol, Pelé, Romário, Ronaldinho, entre outros, já se beneficiaram com isso e se prejudicaram muito também. O grande caso é que Deus não erra, mas como nós estamos falando de seres humanos, esses personagens, por vezes, metem os pés pelas mãos e a conseqüência nós já conhecemos: a mídia cai de pau nos caras porque eles deixaram a divindade de lado e se comportaram como meros mortais. Mas não é o que eles são?
Podemos citar o mal-estar que causou a declaração do goleiro Bruno, quando defendeu o colega Adriano (ambos jogavam no Flamengo), que vivia as turras com a noiva Joana Machado. Disse Bruno: “quem nunca saiu no pau com uma mulher? Quem nunca deu uns empurrões na mulher?”. Embora ninguém tenha certeza do que aconteceu a Elisa Samúdio, essa declaração é usada para afirmar que Bruno é o responsável pelo suposto destino trágico da jovem. A mídia, porém, esquece, que o endeusado Bruno e quase todos os jogadores do futebol brasileiro nascem e crescem em localidades onde é normal dar uns cascudos na mulher.
Sinceramente, para mim não é notícia a ajuda que Zeca Pagodinho deu as vítimas de Xerém. Penso que é notícia o fato de outros atores e cantores não estarem por lá ajudando. Onde estavam os outros artistas que tem fama igual ou maior que o nosso Zeca Pagodinho? Por que não estiveram lá? Alguém vai dizer: “eles mandaram doações”. Beleza, mas será que todos fizeram isso? E nós que não temos fama, o que temos feito pelas vítimas da desigualdade social que está ao lado da nossa casa? Não precisa ter enchente para encontrarmos pessoas carentes.
Concluo dizendo que a nossa sensibilidade foi afetada pelo fenômeno “Criança Esperança”. Ajudamos sem sair de casa. Nós até nos sensibilizamos com a desgraça alheia, todavia, é mais cômodo pegar o telefone e doar uma importância para que outros cuidem daquele pobre infeliz. Eu quero ajudar, mas não quero me sujar, não quero abraço de favelado, não quero pegar crianças pobres e remelentas no colo... Ajudo daqui do conforto da minha casa.
Quem não conhece pessoas que doam vultosas quantias para projetos dessa natureza (Criança Esperança e Teleton) e nunca visitou a creche do bairro onde mora? Gente que ajuda causas sociais em países africanos, mas nunca se preocupou com a comunidade pobre que existe a alguns metros da sua casa! Pessoas que se sensibilizam com os flagelados que aparecem nos telejornais, mas comumente se recusa a pagar um salário decente aos funcionários da sua empresa. Graças a Deus ainda temos alguns “Zecas Pagodinhos” que estão fora dessa alienação midiática.
E assim caminha a humanidade...
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