Flávio Azevedo
No meu tempo de garoto, não existia esse negócio de “bullying”. No tempo que eu era menino, isso era chamado de “brincadeira de mau gosto”. Duvido que exista uma pessoa, que nunca tenha sido alvo desse tipo de situação. Duvido que exista uma pessoa, que nunca tenha tirado um sarro de alguém. Sobretudo nas escolas, os apelidos, as zombarias por características físicas, a religião, por conta da estatura, do emprego dos pais do colega, algum tipo de história familiar; são alvos de “brincadeira de mau gosto”.
É claro que como toda criança, eu também fui alvo de brincadeiras de mau gosto. É claro que como toda criança, eu também já enchi o saco de alguém com uma brincadeira de mau gosto. No clímax da ‘zoação’, quando todos estão rindo de você, a vontade que se tem é de sumir ou de torcer o pescoço de quem está te zoando. Quem nunca passou por isso?
Na manhã da última sexta-feira (20/10), o Brasil assistiu a história de uma tragédia numa sala de aula em uma escola de Goiânia/GO. Um menino de 14 anos atirou em colegas de classe. O “bullying” ou as brincadeiras de mau gosto podem ter sido o fator que levou o garoto a atirar contra os colegas.
Os pais de alunos que são incomodados com “brincadeiras de mau gosto”, às vezes, sabem do sofrimento do filho. Alguns procuram a escola, tentam resolver a questão, outros não. Já os pais dos brincalhões, nem sempre sabem que o filho é um chato. E pior: quando descobrem tentam amenizar o comportamento do seu rebento usando a célebre frase “isso é coisa de criança!”. Ignoram que fatos como o que aconteceu em Goiânia (2017), Realengo (2011) e Columbine (1999) podem acontecer de novo e pela mesma razão: brincadeiras de mau gosto, que cada indivíduo reage de uma maneira.
Desde cedo tomei aversão as tais brincadeiras de mau gosto! Fui ensinado por meus pais que isso era desrespeitoso. Boa parte das crianças e pré-adolescentes, por estarem em desenvolvimento, têm características físicas peculiares. Estão em crescimento e por isso presentam transformações físicas importantes. Orelhas, nariz, seios, olhos, bocas, dentes, cabeça, quadris, pé, chulé e outros odores, desenvolvimento intelectual, espinhas, cabelos, desempenho nos esportes, estatura; tudo isso é afetado e acaba sendo alvo de cruéis brincadeiras de mau gosto.
Eu me lembro de ter tomado duas surras por causa de brincadeiras de mau gosto. As lambadas de vara de amora que me marcaram as pernas foram acompanhadas do “eu já te avisei que não quero você fazendo brincadeira de mau gosto com os outros”. Eu tinha creca de 10 anos e algumas perguntas reflexivas que a minha mãe fez durante as surras me marcaram mais profundamente que a varinha de amora.
– Você gosta que brinquem assim com você?
– Você não reclama que os colegas implicam com você, porque você está fazendo igual?
– Ele não é seu colega, porque está brincando com ele desse jeito?
– Não se trata os colegas e amigos dessa maneira!
E tome lambada de vara!
Aprendi a lição. Passei a ser inimigo das brincadeiras de mau gosto e repreender quem fizesse. Virei um colega chato, porque não brincava. Ainda, hoje, burro velho, passados 30 anos, quando entro numa roda de brincadeira, as palavras de minha mãe e a vara de goiaba me vêm à cabeça! Penso que seria interessante conversar com os nossos filhos sobre esse tipo de situação. Explicar para eles os efeitos da brincadeira de mau gosto, que podem ser assimiladas pelo coleguinha de várias maneiras. E como coração dos outros é terra que ninguém vai seria bom evitar esse tipo de comportamento.
“Que exagero, Flávio!”, dirão alguns. Penso que os pais dos alunos da Colégio Goyases e a direção dessa unidade escolar adorariam ter exagerado nesse tipo de orientação. Penso que eles devem estar, inclusive, analisando profundamente os efeitos das “inocentes brincadeiras de criança”. Talvez, se pais e escola tivessem priorizado isso antes, a triste história da ultima sexta-feira (20) não tivesse existido.
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