Flávio Azevedo
É comum ouvirmos policiais e autoridades discordando das nuances apresentadas pelos filmes “Tropa de Elite”, mas toda aquela podridão que esteve em cartaz e atraiu milhões de pessoas aos cinemas não é ficção. Quando a mídia começa noticiar a trama que existe por trás da morte da juíza Patrícia Acioli, fica muito nítido que não foi só a violência de ambos os filmes que atraíram as pessoas às salas cinema, sobretudo em relação aos envolvidos – policiais militares.
Na verdade, o injustiçado e impotente brasileiro se reconheceu nas histórias de José Padilha e viu no capitão Nascimento, um herói que age e fala tudo aquilo que ele gostaria de fazer e falar, sobretudo porque ele bate de frente com um inimigo que acorda e dorme de todo e qualquer brasileiro todos os dias: O SISTEMA.
O depoimento de um cabo da Polícia Militar preso pela morte da juíza Patrícia Acioli (foto 2) lembra em todas as suas nuances a história da ficção. De acordo com o depoimento, onde ele admite ter atirado na magistrada, o cabo afirma que o tenente-coronel Cláudio Luiz Silva de Oliveira (foto 1) recebia parte das apreensões feitas irregularmente por policiais durante as operações do Grupamento de Apoio Tático (GAT).
O ex-comandante do 7º BPM (São Gonçalo), que está preso sob a acusação de ser o mentor do crime, é suspeito de ficar com o "espólio" do tráfico nas favelas onde realizava operações. O cabo decidiu colaborar com a polícia em troca do benefício da “delação premiada”. De acordo com ele, a execução foi tramada pelo tenente Daniel Benitez, que chegou a propor a contratação de uma milícia do Rio para cometer o crime. A ideia não foi adiante. De acordo com o militar, Benitez era o homem de confiança do tenente-coronel Cláudio, com quem atuou em três unidades da PM antes de os dois serem lotados no 7º BPM.
O policial disse à Justiça que o tenente era o responsável por repassar ao ex-comandante a caixinha do tráfico das favelas do Salgueiro e da Coruja. O valor era pago semanalmente aos policiais do GAT do 7º BPM. A impressão que eu tenho é de já ter assistido essa história no cinema.
Ainda de acordo com o delator, as armas usadas no assassinato da juíza eram "espólio" de operações em favelas de São Gonçalo. Uma delas, a de calibre 40, foi apreendida no Morro da Coruja. Segundo o PM, parte da munição utilizada era do 7º BPM e parte fora apreendida em favelas. Outra arma do crime, o revólver calibre 357, ficou com Benitez, que, segundo o depoimento, também adquiriu a moto usada na emboscada contra Patrícia. O carro utilizado no crime, um Palio vinho, foi incendiado na mesma noite, no bairro Santa Luzia.
O cabo contou ainda que o GAT atuava nas favelas mais perigosas de São Gonçalo. A cada 24 horas, eles eram cobrados para que fizessem grandes apreensões de drogas e armas. De acordo com o depoimento, o grupo não apresentava o material à delegacia. O dinheiro arrecadado ficava com a equipe. O réu colaborador disse ainda que Benitez convidou os integrantes do GAT a se transferirem para o 14º BPM (Bangu), para onde o tenente-coronel Cláudio estava cotado para assumir o comando. Segundo o cabo, o comentário no quartel era que "em Bangu o espólio seria maior".
De acordo com o cabo, a juíza escapou de duas tentativas de emboscada montada pelos policiais. Numa, ocorrida uma semana antes do assassinato, ela escapou por não ter ido ao Fórum de São Gonçalo. O cabo acrescentou em seu depoimento que, dias antes do assassinato, um dos policiais envolvidos no plano havia perdido o rastro da juíza. O PM estava incumbido de seguir Patrícia, mas acabou perdendo a magistrada de vista no Centro de São Gonçalo.
Considerado pela DH fundamental por indicar a participação do tenente-coronel na trama, o depoimento cita ainda a participação de um policial do 12º BPM (Niterói), que levou o tenente Benitez até a casa da juíza, em Piratininga, durante o planejamento do crime. O policial do batalhão de Niterói ainda não foi preso, e por isso não teve o nome divulgado.
O cabo afirmou ainda que, após ter sido preso, juntamente com o tenente Benitez e outro cabo, o tenente-coronel Cláudio esteve no batalhão Prisional Especial (BEP) para conversar com os três. Na visita, no domingo do Dia dos Pais, que não foi registrada no livro de entrada da prisão, o então comandante do 7º BPM se comprometeu a ajudar os três, inclusive indicando um advogado para defendê-los.
O corregedor-geral da PM, Ronaldo Menezes, anunciou que o tenente-coronel Cláudio Luiz de Oliveira seria transferido para o presídio Bangu 8. O militar apresentou-se no Batalhão de Choque, no Centro, por volta das 3h da última terça-feira (27/09), após ser informado pela corregedoria sobre seu mandado de prisão.
O corregedor disse ainda que os outros policiais presos ontem também iriam para Bangu 8 (onde ficam detentos com curso superior). São eles cabo Alex Ribeiro Pereira (7º BPM), cabo Sammy dos Santos Quintanilha (7º BPM), cabo Carlos Adílio Maciel Santos (7º BPM), cabo Jovanis Falcão Júnior (7º BPM), 3º sargento Charles de Azevedo Tavares (7º BPM) e soldado Júnior César de Medeiros (7º BPM).
Outros três já estavam presos desde o último dia 12: o tenente Daniel Santos Benitez Lopes e os cabos Jeferson de Araújo Miranda e Sérgio Costa Júnior. Esses estão em diferentes prisões.
Outro caso em 2006
Até acontecer o caso do tenente-coronel Cláudio, o único oficial da mesma patente preso na PM havia sido o então comandante do 14º BPM (Bangu), Celso Lacerda Nogueira. O tenente-coronel foi preso no dia 15 de dezembro de 2006, dentro das investigações da Operação Gladiador, acusado de corrupção passiva e participação no bando do bicheiro Fernando Iggnacio. Ele foi condenado a sete anos de reclusão. Seu processo, porém, está em recurso no Tribunal Regional Federal da 2ª Região.
O oficial também responde a um Conselho de Justificação na Seção Criminal do TJ do Rio, mas a ação foi suspensa, até que transite em julgado o processo federal. Só aí o processo sobre a perda de patente será julgado.
Fonte: O Globo
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