quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Abuso, intolerância e preconceito

Por Flávio Azevedo - Reflexões

A escola de samba paulistana, Acadêmicos do Tucuruvi, afirma ter recebido e-mails com conteúdo discriminatório por causa do enredo escolhido para o carnaval 2011: “Oxente, o que seria da gente sem essa gente? São Paulo: a capital do Nordeste!”. A ideia é homenagear os milhares de nordestinos que migraram para a “Terra da Garoa” e ajudaram a construir a maior capital do país. No dia 17 de dezembro, a direção da agremiação registrou o ocorrido na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi).

De acordo com o diretor jurídico da Tucuruvi, Carlos Malachim, a decisão de procurar a polícia aconteceu porque não foi um fato isolado. “Os primeiros e-mails foram deletados, mas como o cidadão manda o mesmo texto através de e-mails diferentes, nós decidimos registrar o fato”. As mensagens criticam, segundo o diretor, a escolha do tema para o enredo da escola.

No dia 27 de dezembro, uma mensagem chamou a atenção da Tucuruvi, não só pelo festival de palavrões, mas porque ameaçava “acabar com quem defende o enredo”. Malachim divulgou um trecho do e-mail para a imprensa: “Tomara que esse carnaval seja o pior de todos da escola. É o que desejam todos os paulistas separatistas”. O perturbado que escreveu o texto assina como “São Paulo é meu país”.

Outra mensagem com conteúdo similar foi encaminhada, no dia 7 de dezembro, para a Ouvidoria da São Paulo Turismo (SPTuris), responsável pela organização do carnaval. A polícia paulista tenta chegar ao responsável pelas mensagens, mas todos nós sabemos que a legislação Brasileira em relação a crimes virtuais está na Idade da Pedra.

Eu confesso que fico curioso. Quem seriam esses separatistas? Pertencem a que classe social? São filhos ou filhas de quem? Estudaram em que colégios? Frequentam quais espaços? Conhecem o que da história para se dizerem separatistas? Aliás, esses filhotes da burguesia paulista – a mais complexa do país – sabem o que significa o termo “separatista”? Quais são os valores sociais e familiares que esses indivíduos receberam em casa? Será que eles conhecem os pais?

Na época do atropelamento – que eu prefiro chamar de assassinato – do filho da atriz Cissa Guimarães, o comentarista Arnaldo Jabor, em uma das suas ácidas e verdadeiras reflexões, disse que “no Rio de Janeiro existe o bafômetro, mas o governo deveria criar o machômetro”. O instrumento seria utilizado para identificar os “machinhos ricos”. Confiantes na impunidade e na influência de pais poderosos, eles percorrem as noites cariocas como se estivessem desbravando uma floresta ou participando de um rali. “Não é exibição de riqueza, mas de poder!”, critica Jabor.

Em São Paulo não é diferente. Esses tais separatistas podem ser comparados aos integrantes da Ku Klux Klan, uma organização racista dos Estados Unidos que apoia a supremacia branca e o protestantismo como única religião. Fundada no Tennessee, em 1865, pelo general Nathan Bedford Forrest, o objetivo era impedir a integração social dos negros recém-libertados. A intenção do general era não permitir que eles adquirissem terras e outros direitos concedidos aos cidadãos brancos como, por exemplo, votar.

No Brasil, uma análise desses tais separatistas mostra que esses grupos são formados, em sua maioria, por jovens e adolescentes que nunca sofreram privações e/ou necessidades. Eles são filhos de famílias abastadas e ricas que, por incrível que possa parecer, construiram fortuna explorando a mão de obra dos pobres nordestinos que chegavam ao Sudeste fugindo da seca.

Entretanto, o comportamento infantil, egoista, futil, desatento e inconsequente, de pais coniventes e despreocupados, permite que os filhos adquiram ideologias preconceituosas – às vezes, reflexo do que ouvem dos seus progenitores. Num Brasil onde é urgente a necessidade de mudanças, acreditamos que esses filhinhos de papai lucrariam muito mais se gastassem energia com ideologias que contribuissem para transformar o Brasil num país melhor. Contudo, como isso representaria abrir mão de luxos que eles não querem renunciar. É preferível, então, perseguir homossexuais, prostitutas, estrangeiros, índios, pobres e nordestinos!

Nenhum comentário:

Postar um comentário