Flávio Azevedo
Na década de 80, eu ainda garoto,
comecei a ouvir falar de um sujeito chamado Lula. O Brasil saia do regime ditatorial,
o presidente que assumiria (Tancredo Neves) morreu antes de tomar posse (uma
morte cercada de teorias da conspiração)... Assumiu Sarney e uma inflação
galopante aniquilou o brasileiro. Veio Collor, um bonitão que confiscou a grana
das cadernetas de poupança e fez movimentos que culminaram com o seu impeachment
(já na década de 90). Nesse interim, as pessoas começam acreditar fielmente que
a solução seria dar uma oportunidade ao torneiro mecânico.
Com o impeachment de Collor, assume o
comando da nação Itamar Franco, que foi sucedido por Fernando Henrique. A
notícia boa foi o Plano Real. Mas uma série de histórias esdruxulas desgastou o
“tucanismo” e fez o povo acreditar no Lula e no seu discurso de “Um Brasil de
Todos”. Artistas importantes davam a popularidade que torneiro mecânico
precisava para se tornar presidente do Brasil. E aconteceu!
Com Lula na presidência, o Brasil
realmente passou por transformações sociais “nunca vistas antes na história
desse país”. Além do Bolsa Família, pró isso, pró aquilo, Fome Zero e outros
benefícios; as classes mais humildes passaram ate acesso a bens e serviços
nunca alcançados na história desse país. Esse cenário não pode ser nunca
ignorado.
Todavia, nesse período a corrupção foi
institucionalizada. Sacanagem sempre houve, mas era tratada na calada da noite.
A palavra propina, até ali cercada de tabu tornou-se oficial. Dinheiro ilícito,
até ali entregue nos cabarés e prostíbulos de Brasília, passaram a ser
depositados em conta como se fossem salários e resultados de operações
financeiras comuns. Negociatas e esquemas, antes conservados nos bastidores mais
profundos da República, passaram a ser tratadas nas mesas de tomadas de decisão
dos três poderes.
Vejo muita celebração no aperto contra
a cúpula petista (Lula, Zé Dirceu, Genuíno, Dilma Rousseff), como se somente
esse partido estivesse por trás dos absurdos que estão sendo desvendados pela
Operação Lava Jato. A detenção de banqueiros, lobistas e altos executivos de
empreiteiras importantes também tem sido celebrada, sobretudo por vivermos num
país onde a prisão é para negros e pobres. Ver políticos de grife, por exemplo,
o senador Delcídio Amaral (PT), sendo levado pela Polícia Federal numa operação
que só víamos contra bicheiros e traficante, dá uma sensação de alma lavada.
Nas ruas, movimentos “pró Lula” e “Fora
Lula” são arremedos de representação popular, porque ambos mostram um povo manipulado
e uma massa alienada. Apesar de ter um pé atrás com o Judiciário, esse Sérgio
Moro me transmite confiança e o molde “Mãos Limpas” (operação feita na Itália
contra a corrupção) da Operação Lava Jato é o caminho. Todavia, alguns aspectos
da Operação “Mãos Limpas” precisam ser pensados. Iniciada em 1992, a operação
italiana investigou 872 empresários, 438 parlamentares, quatro primeiro ministros
e sepultou os quatro maiores partidos do país. Teve gente que se matou, entre
eles o presidente da petroleira estatal (ENI), Gabriele Caggliari, que era o
centro da economia italiana. Outro suicídio emblemático foi de Raul Gardini, um
dos maiores empresários da Itália. Até o lendário Giulio Andreotti, considerado
o maior politico italiano, esteve perto de ser preso.
Há quem se preocupe com os efeitos
futuros da Lava Jato, porque, na Itália, a Operação Mãos Limpas abriu um vácuo
de poder que teve efeitos devastadores na economia e na política. Até movimentos
separatistas (o Norte querendo se separar do Sul) ocorreram. O vazio de poder
causado pela destruição dos tradicionais partidos, as velhas e corruptas
lideranças e executivos importantes da Itália, abriu espaço para aventureiros e
gente muito mais voraz que aqueles que vinham atuando até ali. Algumas
correntes entendem que a Operação Mãos Limpas foi um monumental fracasso, porque
ela não acabou com a corrupção, apenas trocou os seus atores.
Diante desse cenário e pensando no que
está acontecendo no Brasil, o texto final do segundo filme “Tropa de Elite”
fica muito nítido e real. Em suas reflexões finais, o capitão Nascimento diz que
“o sistema entrega a mão para salvar o braço... O sistema se reorganiza,
articula novos interesses... Cria novas lideranças. Enquanto as condições de
existência do sistema estiverem aí, ele vai resistir!”.
A forma de fazer política
na Itália é muito similar ao que vemos no Brasil. Eles sempre conviveram com a corrupção.
O país nunca foi marcado por políticos honestos e para quem não sabe, a propina
é uma invenção italiana e, exatamente como acontece no Brasil, é cultural. Há quem
defenda a ideia de que é melhor lidar com espertinhos criativos que com honestos
burros e medíocres. A explicação é simples: ao longo da história da humanidade,
as grandes economias sempre nasceram da ideia criativa de históricos pilantras
e nunca de monges franciscanos.
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