Num país que está
na lanterna dos rankings internacionais de educação, o Fisco dá as costas aos
brasileiros que querem investir mais na qualidade do ensino. Os gastos dos
brasileiros para manter um filho em colégio particular só podem ser descontados
em até R$ 3.230,46 no Imposto de Renda (IR) 2014, ano-base 2013. Em outros
países, os incentivos são bem maiores: o valor para dedução é o dobro nos EUA
(US$ 4 mil) e integral em vizinhos latino-americanos como Peru, Paraguai e
Venezuela, segundo levantamento exclusivo da consultoria EY (a antiga Ernst
& Young) em 20 países.
A pesquisa mostra
que a mesma lógica se aplica à dedução dos gastos com a educação do próprio
contribuinte, considerada fundamental para qualificar a mão de obra nacional e
aumentar a produtividade das empresas. O desconto no Brasil é de R$ 3.230,46.
Esse valor chega a ser 342% maior na Alemanha (US$ 7.679,98), já considerando
no cálculo a paridade de poder de compra (custo de vida) medido pela OCDE,
segundo as contas da EY. Seguindo a mesma regra, o valor da dedução no Brasil
equivale a US$ 1.735,94. No Reino Unido, a dedução autorizada pelo Fisco é
integral.
Segundo o gerente
sênior de Capital Humano da EY, Leandro Souza, alguns dos países mais bem
colocados no Pisa (a mais importante pesquisa internacional sobre educação)
oferecem incentivos maiores ao ensino pela dedução de despesas por dependente
ou do próprio contribuinte. É o caso da Alemanha, 16º lugar em Matemática, que
permite deduzir inclusive gastos com livros. O Brasil está aquém da média no
ranking: em Matemática, ocupa a 58ª posição entre 65 países da pesquisa. Na
área de Leitura, está em 55ª e, em Ciência, na 59ª posição.
– Os países
desenvolvidos, que têm um ensino público de muita qualidade, voltam seus
incentivos para o aperfeiçoamento profissional dos cidadãos, que é uma forma de
avançarem profissionalmente e ganharem mais, o que significará mais arrecadação
no futuro. É uma ideia interessante, mas não parece ser do interesse dos nossos
governantes – diz o gerente sênior de Tributos da EY.
Mesmo países
emergentes, contudo, estão na frente do Brasil. No México, os gastos por
dependentes podem ser reduzidos em até 24.500 pesos mexicanos (US$ 3.127,07
considerando a paridade de poder de compra), 80% mais do que no Brasil. E as
despesas com transporte escolar podem ser deduzidas. Na Índia, são cem mil
rúpias (US$ 4.783,55), 176% a mais do que no Brasil. Dos emergentes, somente na
estatizada China, 1ª colocada no Pisa, não é possível qualquer dedução de
despesas com educação.
Especialistas
defendem o aumento do limite da dedução (que foi criado em 1964 e que
representava 20% da renda bruta) ou mesmo sua retirada, como ocorreu com as
despesas com saúde. Afinal, dois meses de mensalidade em colégios particulares
do Rio cobrem a dedução do IR para um ano inteiro com educação. Levantamento do
GLOBO no fim do ano passado mostrou que as mensalidades para o ensino médio
chegavam a R$ 1.625 no Colégio São Vicente de Paulo, no Cosme Velho, e a R$
2.525 no colégio Cruzeiro, no Centro.
OAB vê limite como
inconstitucional
O advogado Richard
Edward Dotoli lembra que o governo não limita gastos com saúde, já que “não é
capaz de promover a saúde para todos". Para ele, o tratamento deveria ser
o mesmo na educação. “Temos carência de formação de mão de obra e precisamos
incentivar a educação”. Ele lembra que o governo oferece incentivos para
consumo, como geladeira, batedeira elétrica e questiona: “Geladeira é mais
importante que a educação?”.
A esperança dos
contribuintes pode estar depositada na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que
move um Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal
(STF) para derrubar o limite de dedução.
– Nossa tese é que
em relação à saúde não há limite de isenção. Educação, como saúde, é um direito
social básico. Não pode existir, portanto, limite para a dedução das despesas
com a educação no Imposto de Renda, especialmente em um país que quer priorizar
a educação para o futuro – disse Marcus Vinicius Furtado Coêlho, presidente
nacional da OAB.
Segundo estimativa
da Advocacia-Geral da União (AGU), a retirada do teto de dedução com gastos de
educação teria um impacto de R$ 50 bilhões na arrecadação. É mais do que o
corte de R$ 44 bilhões do Orçamento deste ano e capaz de afetar gravemente as
contas públicas, o que torna uma vitória mais distante. A OAB contesta o
número: os gastos com instrução declarados no exercício 2011, ano-base 2010,
foram de R$ 31,37 bilhões, mas o teto legal limitou a dedução desses valores a R$
15,46 bilhões.
Para a
especialista Priscila Cruz, do programa Todos pela Educação, o sonho da nova
classe média é transferir seus filhos de escolas públicas para colégio
particulares. Ela afirma que o desejo das famílias é ter os filhos em escolas
“com disciplina maior, nas quais o professor não falta”. O incentivo tributário
pode ajudar a realizar esse sonho.
Fonte: O Globo
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